2.05.2008

Separar o trigo do joio



Ao contrário de alguma argumentação,
a introdução de transparência na vida pública
não coloca a todos sobre suspeição

António José Seguro

A corrupção regressou à agenda pública. E regressou, deixemo-nos
de hipocrisias, porque a corrupção existe. O Presidente da República
já por quatro vezes alertou para a necessidade de a combater,
o Parlamento analisa, desde Fevereiro de 2006, várias iniciativas legislativas sobre a matéria e o Governo anunciou a criação, no interior da PJ, da Unidade Nacional de Combate à Corrupção.

A corrupção existe. É um problema sério e transversal aos diversos sectores da sociedade portuguesa. No último «ranking» de corrupção internacional da International Transparency, calculado através da recolha de opiniões de analistas e de empresários sobre a percepção
da corrupção no sector público, Portugal consta da lista e tem à sua frente 25 países com menor índice de corrupção.

Segundo estudos da mesma organização internacional, recentemente conhecidos, os cidadãos colocam os políticos no topo da corrupção
e os portugueses não fogem à regra.
Esta percepção alicerça-se no conhecimento de casos reais, alguns com um elevado grau de divulgação mediática, que rapidamente são objecto de generalização a todos os que desempenham cargos políticos.
Ora, esta generalização é errada, porque em todos os sectores
há pessoas que agem de acordo com a lei e outras que o não fazem,
e ao meter-se tudo no mesmo saco, acaba-se por enlamear os honestos e proteger os corruptos.

Por outro lado, os poucos resultados produzidos, designadamente
na recolha da prova, consolidam o sentimento latente na sociedade portuguesa de que os ‘poderosos’ se protegem e de que existe uma certa impunidade.

Estas realidades minam a confiança dos cidadãos nos políticos
e corroem os alicerces do Estado de Direito Democrático.
A situação é grave e tem vindo a alastrar-se. É dever dos democratas combater esta podridão e afastar a nuvem de suspeição que paira sobre a actividade pública. Com seriedade e sem receios.

Desde logo, dando o exemplo, com a afirmação da disponibilidade para a explicação da origem do respectivo património. Depois, pela adopção de boas leis, da afectação de recursos adequados à investigação
e pela introdução de maior transparência na prática de actos públicos.

Insisto na necessidade de maior transparência porque só esta permite um maior controlo da gestão dos recursos e da prática de actos públicos e, consequentemente, acarreta uma maior responsabilização individual. A cada cêntimo, de dinheiros públicos, gasto deverá corresponder
a publicitação, para o exterior do sistema institucional, da forma como foi utilizado. O mesmo critério deverá ser aplicado, por exemplo, para as razões que fundamentam o pagamento de trabalhos a mais nas obras públicas, bem como para alguns processos administrativos, designadamente no sector urbanístico.

Ao contrário de alguma argumentação, a introdução de transparência na vida pública não coloca a todos sobre suspeição. Bem pelo contrário, a transparência elimina a suspeição sobre os honestos,
reforça a confiança no Estado de Direito Democrático e diminui o risco
da corrupção.

E a diminuição da corrupção liberta os dinheiros públicos para serem utilizados nas políticas públicas de saúde, de emprego e de educação.

@: Expresso 02/02/08

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.