Segundo os evangelhos,
a omissão é um pecado que se faz não fazendo
Hoje veio-me à memória, com saudade, após ter lido algo na internet, os tempos da minha infância, da catequese paroquial e das homilias na missa de domingo quando eram citadas as parábolas dos evangelhos.
Naquela época gostava de ouvir a leitura dos textos sagrados com o mesmo encanto que ouvia os contos de fadas recitados pela minha mãe, pois com aquela idade o meu desenvolvimento cognitivo tinha dificuldade em distinguir o real do imaginário. A minha imaginação de criança “voava” com a leitura da Bíblia, a qual utilizando uma linguagem fundamentalmente simbólica e lida pela catequista, tinha o condão de prender aquele grupo de crianças, mais do que as rezas que inevitavelmente acabámos por aprender.
Esses ensinamentos fizeram parte da minha educação e graças a eles comecei a desenvolver aquilo que se designa por desenvolvimento da consciência moral. A catequização acabou inevitavelmente por moldar, em grande medida, os meus comportamentos no caminho que tenho percorrido.
Foi assim que aprendi o significado dos sete pecados mortais que ao longo do cristianismo sofreram alguns ajustes e alteração da sua hierarquia, tendo sido S. Tomás de Aquino no século XIII a elaborar nova lista até há bem pouco tempo aceite: Vaidade; Inveja; Ira; Preguiça; Avareza; Gula e Luxúria.
São pecados capitais porque deles nascem outros e outros e outros. São Tomás, na sua Suma Teológica explica que a grande característica desses pecados não é sua gravidade, mas “é que eles são extremamente desejáveis, tanto que por eles um homem comete muitos outros pecados”.
Estes pecados podem cometer-se por acto,
omissão, pensamento ou desejo
Entretanto o Vaticano publicou em 2008 no “Osservatore Romano" os novos pecados mortais a agregar aos sete já existentes. São eles a manipulação genética, o uso de drogas, a desigualdade social e a poluição ambiental.
Com o tempo fui aprendendo com alguma dificuldade a distinção entre pecado mortal (grave) e venial (leve).
Estes pecados podem cometer-se por acto, omissão, pensamento ou desejo. Em todo o pecado há duas malícias:
"Cristo ensina no Evangelho que sofrerão o castigo eterno não somente os que fazem o mal, mas igualmente aqueles que omitem o bem que estavam obrigados a fazer"
Enquanto criança compreendia o significado de pecar pela acção, pensamento ou desejo mas cometer um pecado por omissão?
Tardiamente, já adolescente, acabei por entender que cometer um pecado por omissão era tão ou mais grave que pecar pela acção.
“A omissão, conforme assinalou o Padre Antônio Vieira no Sermão da primeira dominga do advento, (...) é o pecado que com mais facilidade se comete e com mais dificuldade se conhece; e o que facilmente se comete e dificultosamente se conhece, raramente se emenda”.
A omissão é um pecado que se faz não fazendo.” “Aquele, pois, que sabe fazer o bem e não o faz comete pecado.”
O que fez fervilhar a minha mente e consequentemente o apontamento precedente, foi a leitura do texto que reproduzo de seguida:
PCP contra silenciamento nas televisões
O PCP enviou anteontem, aos directores de Informação da RTP, da SIC e da TVI, um protesto contra o silenciamento da iniciativa política do Partido durante o mês de Maio. (…)
Entre outras, a SIC ignorou a deslocação de Jerónimo de Sousa a França e ao Luxemburgo, (…) «Observando os noticiários da vossa estação de televisão, (…) verificamos que tudo coube dentro dos critérios televisivos da vossa estação, menos a iniciativa política do PCP, o que constitui uma inaceitável atitude de omissão da acção do PCP e negação do direito à informação» - afirma-se no protesto enviado a Alcides Vieira. (….) por parte da TVI na cobertura da actividade política do PCP, (..) constitui uma inaceitável atitude de omissão da acção do PCP e a negação do direito à informação».
Aos três directores, o PCP reafirma que, «a uma sociedade que se quer livre, democrática e plural, deve corresponder também uma comunicação social que respeite os mais elementares princípios de pluralidade democrática e que não se limite à cobertura da iniciativa e propaganda do Governo PS e da vida interna do PSD como aconteceu durante este último mês».
O Partido declara que «não se conforma», protesta «contra o deliberado silenciamento do PCP» por parte das televisões e exige que a RTP, a SIC e a TVI procedam «à cobertura, em igualdade de circunstâncias com as restantes forças políticas, da actividade e intervenção do PCP na sociedade portuguesa." @: avante.pt Face a este texto publicado no “Avante Digital” e sendo o PCP/PEV a força maioritária no executivo camarário, assembleia municipal, juntas de freguesia que edita os respectivos boletins, dispõe também de uma página na internet, pergunto-me: que espaço é reservado para a oposição, igualmente legitimada pelo sufrágio eleitoral, manifestar os seus pontos de vista nesses “órgãos de informação concelhios”?
O Poder Autárquico do concelho, cada vez mais personalizado na figura do seu Presidente, monopoliza cinicamente todos os “meios de comunicação social” pagos por todos os cidadãos e à revelia dos pareceres da Alta Autoridade para a Comunicação Social e das recomendações do Provedor de Justiça, constitui igualmente uma inaceitável “atitude de omissão” das iniciativas, opiniões e tudo o mais que as oposições queiram tornar públicas nesses mesmos “meios de comunicação social”.
Relativamente a estes atropelos cometidos pelas autarquias, o Provedor de Justiça assente em várias orientações da Alta Autoridade para a Comunicação Social recomendou:
“a) Permitir o exercício, no âmbito dos Boletins Autárquicos, designadamente dos direitos de resposta e rectificação;
b) Criar um espaço, nos referidos Boletins, que se considere adequado de acordo com as orientações acima expressas da Alta Autoridade para a Comunicação Social, para a Oposição poder divulgar as suas iniciativas, opiniões, etc.
c) Aplicar as orientações expressas em a) e b) ao mesmo tipo de informação da Câmara Municipal constante dos Boletins, quando veiculada através da Internet.”
Sem o sabermos vamos sendo conduzidos
como ovelhas para o matadouro
Perversamente os vários poderes ao fazerem tábua rasa destas elementares recomendações, contribuem para afastar cada vez mais os cidadãos da discussão da coisa pública, dificultam o confronto de ideias sobre os problemas que nos afectam e, consequentemente muitos de nós sem o sabermos vamos sendo conduzidos como ovelhas para o matadouro por meia dúzia de políticos iluminados.
Assim, admitindo como justa a manifestação do PCP contra o inaceitável atitude por omissão da sua acção por parte dos agentes que detêm o poder de programação das televisões eu pergunto: os representantes da maioria PCP/PEV na nossa Autarquia não estão a proceder ainda mais veemente que as televisões, porque públicos são todos os “meios de comunicação social” ao dispor do município?
Na perspectiva do catolicismo já aflorada, as pessoas que dominam os “órgãos de informação concelhios” estão a cometer um pecado por omissão, relativamente à acção da oposição.
É este o pecado que corrói a nossa sociedade que se faz não fazendo, perante quem necessita da nossa ajuda.
É igualmente pecado por omissão que se faz não fazendo, perante as vozes daqueles que nos contradizem.
carlotafialho@hotmail.com
Imagens de Francis Bacon [Tree Studies for Figures at the Base of a Crucifixion]
Recebido em: vianadoalentejo@hotmail.com